QUESTÃO EDUCATIVA #1: IRON MAIDEN E A BATALHA DE PASSCHENDAELE.
- Wender Imperiano
- 14 de mai. de 2019
- 5 min de leitura
Atualizado: 19 de mai. de 2019
Hoje resolvi inaugurar uma série que será retomada de tempos em tempos na minha coluna musical: Questão Educativa. O intuito é mesclar o música e conteúdo informativo-educacional.
Eu, como professor que sou, sempre me interessei pelo uso da música em sala de aula. Também, sempre fui favorável ao uso do Rock n’ Roll em ambiente escolar, justamente por ele ser um tanto negligenciado em nosso país, pois sabemos bem que diversos outros gêneros musicais são mais bem quistos pelo grande público.
Vejo, ainda, como uma forma de quebrar o preconceito, que muitos alunos ainda têm, quando alegam coisas do tipo “Ah, Rock é coisa do diabo”, “Eu que não vou ouvir uma música que nem entendo”, “Esses caras xingam a nossa mãe e nem notamos”, “Rock é só barulho” e etc. Sabemos que não é bem assim, e que bandas de Rock possuem canções memoráveis, que nos chamam para a reflexão e até nos contam histórias reais de forma intensa, envolvente e poética.
Esta “sessão” servirá como suporte para professores, estudantes e leitores comuns que querem apenas se instruir um pouco mais.
Então, para dar o pontapé inicial nesta série, escolhi a minha banda favorita: O Iron Maiden.
Você, professor, estudante, ou fã de música, venha comigo e o Iron Maiden “embarcar” dentro da sangrenta Batalha de Passchendaele!
O local é Ypres (ou Ipres), município Belga de aproximadamente 34 mil habitantes. Lugar pequeno, pacato e cheio de vilas espalhadas pelo seu território. Pelo que pude apurar, já que as informações são um tanto escassas [A batalha é mais famosa que o próprio local], é que dentre as inúmeras vilas, encontramos Passchendaele, palco de um dos confrontos mais sangrentos da Primeira Guerra Mundial.
A batalha de Passchendaele (também conhecida como a Terceira Batalha de Ypres) aconteceu entre 31 de Julho de 1917 a 31 de Dezembro do mesmo ano, ou seja, há mais de cem anos atrás.
O “palco” consistia em uma área repleta de lama, tendo em vista que os arredores de Passchendaele era composto por um terreno pantanoso, e bastava chover para que tudo ficasse muito mais difícil, principalmente no que se refere à locomoção, transporte de vítimas, reabastecimento de estoque de comida, entrega de medicamentos e até mesmo fazer frente de ataque ao inimigo.
A título de informação, citamos trecho da reportagem do Portal Terra, Bélgica relembra 100 anos da Batalha de Passchendaele (clique aqui para ler mais), que fala sobre a dificuldade de se guerrear no ambiente repleto de lama:
Em agosto de 1917, aquela área da Bélgica viu quatro vezes mais chuva do que no mesmo período de 1914, o que impossibilitou as tropas de ambos os lados obter avanços decisivos. Fotos dos campos de batalha mostram um lamaçal sem fim, entrecortado por algumas árvores secas de copas cortadas. Lloyd George chamou Passchendaele de "a campanha da lama".

Fotografia tirada do campo de batalha; Notem o lamaçal.
Neste cenário desolador de Passchendaele, estima-se o seguinte número de mortos nesta batalha que durou “apenas” CINCO MESES: 217 mil soldados alemães e 250 mil soldados das forças aliadas.
É envolto desta aura sufocante que o Iron Maiden resolveu contar uma história, relatada na canção “Paschendale”, do disco Dance of Death, lançado em setembro de 2003. A referida foi composta por Adrian Smith e Steve Harris. (OBS: Acho surpreendente que não tenha sido Bruce Dickinson o criador desta letra, pois este é formado em história, e muito me admira em ver o quanto que outros membros adoram o assunto e escrevem com maestria.)
Sobre a música Paschendale (note que a banda batiza a música com a escrita em inglês, e não da forma Belga, que seria “Passchendaele”), destacamos os seguintes momentos (acompanhe a tradução da música aqui):
1. Na primeira estrofe, a banda revela o “personagem anônimo” da história: A canção conta a saga de um jovem soldado entrincheirado no campo de batalha, em uma terra longe de casa; O medo toma conta do seu coração, e só lhe resta rezar para trazer conforto naquele ambiente causticante; Podemos até mesmo interpretar que a canção se inicia com as memórias do jovem soldado, que já se encontrava alvejado no meio do campo de batalha e, a partir daí, começa a narrar sua desventura na batalha de Passchendaele;
2. Dentro de uma trincheira cheia de sangue, em um ambiente impregnado de fumaça, lama e chumbo, o jovem soldado espera o momento certo para sair para o combate e, assim, enfrentar a rajada de bala vinda do inimigo; Enquanto isso não acontece, o personagem vai criando coragem, pois se encontra tomado pelo terror que a guerra proporciona, chegando ao ponto de, segundo a letra da música, “enferrujar suas balas com lágrimas”;
3. A coragem chega e o personagem se atira ao campo de batalha, a fim de matar seus inimigos. Porém, em seu caminho o que mais vê e ouve são assobios, gritos, corpos pendurados em arames farpados; Em meio à batalha, ele sacramenta para si mesmo: “Logo irei me reunir aos meus amigos mortos”;
4. No ápice da batalha, o jovem soldado (de provavelmente 18 anos; digo isso por que na letra é relatado que muitos soldados tinham esta idade, o que tento presumir que seja a mesma do personagem), embora sinta a morte cada vez mais perto, luta bravamente para sobreviver, pois pretende contar a história daquela batalha bestial que aconteceu em Passchendaele;
5. Correndo às cegas, desviando de minas terrestres, correndo em direção aos canhões dos inimigos, acontece uma explosão, o personagem e seus companheiros tombam ao chão, o jovem grita, mas não é escutado, então sente o sangue escorrendo pela sua garganta; O fim está próximo;
6. Em seguida, entra o refrão, destacando a vontade do jovem soldado em voltar para casa. Refrão este cantado de forma magistral por Bruce Dickinson;
7. Por fim, o jovem soldado narra o seu processo de desencarne (saída do espírito da “carne”) quando assim ele diz: “Vejo meu espírito sobre o vento/ bem além das linhas inimigas/ Amigos e inimigos se encontrarão novamente/ Todos aqueles que morreram em Passchendaele”.
Paschendale é uma das canções épicas do Iron Maiden que eu mais gosto. Sua atmosfera única e a cadência instrumental envolvente, que vai se encaixando perfeitamente com os momentos vividos pelo jovem soldado, formam uma receita imperdível para o ouvinte embarcar em uma viagem fantástica, em que nos colocamos dentro de um dos campos de batalha mais violentos da Primeira Guerra Mundial.
Destaco o vídeo postado ao final deste texto, pois mostra a banda executando a música Paschendale durante a turnê do disco Dance of Death, registrado no CD/DVD Death on the Road, pois podemos notar a genialidade do Iron Maiden, principalmente na interpretação sui generis de Bruce Dickinson, para trazer a atmosfera da canção ao público. Pelo que pude apurar, a referida canção não mais foi tocada ao vivo. Um pena!
Recomendo a audição repetidas vezes, bem como deixo o convite para que busquem mais informações sobre esta batalha desumana, pois pouco, ou quase nada, é falado em sala de aula. Dilatem seus conhecimentos, assim seremos seres humanos cada vez melhores.
Abraços.
Iron Maiden - Paschendale [Death on the Road] [Legendado]
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